É do conhecimento generalizado, que a sigla 917 tem para a Porsche um muito significado especial. Tão só e apenas, porque foi um destes modelos que deu à marca germânica a sua ambicionada primeira vitória naquela clássica.
No entanto, patamares houve que tiveram que ser percorridos até se chegar ao momento da glória. E a primeira aparição em Le Mans de um destes modelos, ocorreu em 1969, numa adaptação do modelo 917 KH, um modelo quase sem traseira. Mas para que melhor partido se tirasse, os homens da marca alemã, adaptaram uma traseira que proporcionava um melhor escoamento do ar, permitindo dessa forma um ganho de velocidade pura resultando um enorme proveito da longa recta das Hunodiéres.
Foram inscritos 4 modelos, mas participaram apenas três. A traseira não escondia um puro acrescento ao existente 917 cauda curta, mas era-lhe acrescentado na extremidade, o aileron dinâmico, isto é, um aileron que através de uns tirantes fazia a sua ligação aos braços da suspensão. À medida que a velocidade do carro aumentava, a posição do aileron tornava-se cada vez mais horizontal, fazendo desaparecer a sua resistência à passagem do ar. Dessa maneira, ganhava-se apoio em curva e velocidade em recta.
A Porsche Salzburgo, uma parente muito próxima da Porsche alemã, inscrevia no ano de 1970 dois modelos. Radicais no conceito, repartiam pouco mais do que o chassis e a parte mecânica. Eram o 917 KH (curto) e o 917 LH (cauda longa). Qualquer deles bem distinto no entanto da versão apresentada e vista no ano anterior. Era mantido o cokpit e tudo o resta que se mantinha, tinha mesmo a ver com a mecânica e chassis. Até o posicionamento dos escapes deixou de ser lateral para surgirem na traseira.
O mais básico de todos os 917 presentes nesta edição de Le Mans, acabou mesmo por ser o grande herói. Menos potente e com uma carroçaria que não recorria a qualquer tipo de alteração à sua originalidade, brilhou ao ser o modelo a cumprir mais voltas na edição de 1970, ano do primeiro de muitos brilharetes que a marca foi conseguindo naquele traçado francês.
Mas, se este Team conseguiu a vitória absoluta com o 917 KH, já havia brilhado nos treinos com 917 LH ao estabelecer a melhor volta dos treinas conseguindo assim a pole position. A sua velocidade era de facto a sua mais forte arma, mas a sua resistência acabou por ser atraiçoada pelo aumento de potência dos seu motor.
Mas este Team ficou para a história com estes dois registos. E fica para a história também, que apesar da série 917 KH ter sido desenvolvida para as longas rectas de Le Mans, nunca um modelo da marca nesta configuração levou a melhor sobre os cauda curta.
Mas as linhas do KH foram mesmo desenvolvidas para uma extraorninária redução ao atrito atmosférica, como se mostra através da silhueta do modelo na imagem de baixo. Uma frente em cunha e uma traseira muito alongada, permitiam-lhe um extraordinário coeficiente de penetração.
Participou ainda outro 917 KH inscrito pela Martini Racing (psicadélico). Embora menos potente que este, conseguiu atingir a meta na segunda posição absoluta.
Mas esta edição viu uma série de modelos 917 KH inscritos, com o Team de John Wyre a trazer 3 modelos sob as cores da Gulf e um importante lote de experimentados pilotos.
Mas também o privado David Piper surgiu com um destes Porsche onde a marca de vinhos do Porto "Sandeman" fez a sua aparição como patrocinador do modelo Nº18. Numa configuração básica deste modelo, poderemos apontar algumas modificações relativamente aos restantes participantes.
Na extremidade traseira e na parte central do capôt-motor, surge um apêndice aerodinâmico transparente, nunca mais visto em modelo nenhum. Curiosos também são a colocação dos depósitos situados entre os guarda-lama da frente e as portas. Ainda referir que o retrovisor toma o seu lugar no exterior da capota, surgindo uma abertura na mesma para que o piloto conseguisse fazer chegar a este elemento o seu olhar.
E o Team de John Wyre inscreveu três 917 KH e onde a maior diferença para os restantes KH se encontra na modificação da largura do capôt-motor na zona das suas rodas. Com vias mais largas, viram-se obrigados a esta alteração. Como particularidade ainda, pode verificar-se a existência de um pequeno aileron na extremidade central do capôt traseiro. No capôt-motor onde se encontra o logótipo "Gulf Porsche" aparece também uma pequena tomada de ar que nos outros modelos não está. Deveremos referir que em cada um deles surgem pormenores que marcam a diferença, como por exemplo a colocação do corta-corrente, os pilotos iluminadores dos números, etc...
Em baixo pode observar-se que o alargamento do capôt-motor na zona do eixo das rodas, confere-lhe uma forma inusual para este modelo.
E 1971 traz alterações significativas aos modelos e nova vitória absoluta.
Para a versão KH o desenho do capôt-motor foi completamente revista, aparecendo mais baixa, mais larga e com dois apêndices verticais. Tanto o Team de John Wyre como o Team Martini Racing apostam neste novo KH, mas apostando também em simultâneo no remodeladíssimo LH. Mas uma vez mais o 917 KH saiu vencedor através do modelo Nº22 inscrito pela Martini Racing.
Mas também uma vez mais, parece não haver dois modelos iguais. E mesmo dentro da mesma equipa, os elementos do corta-corrente e os pilotos iluminadores dos números, tomam lugares e formas distintas. Mas se atentarmos nas duas frentes dos 917 KH do Team Gulf, podemos reparar que no modelo com o Nº18 surgem duas pequenas entradas de ar acima dos faróis. No mesmo carro aparece também uma tomada de ar central acima do número enquanto no carro com o dorsal 17 esta encontra-se mesmo junto ao pára-brisas.
Vejam-se as formas dos buracos onde se encontram os corta-corrente, nos dois modelos da mesma equipa.
Mas em relação ao modelo do ano anterior, o LH apresenta-se com uma frente de formas mais quadradas e o capôt-motor cobre metade das rodas traseiras ao mesmo tempo que as duas grandes tomadas de ar superiores que existiam nos modelos de 1970, agora desapareceram.
Mas 1971 vê surgir também o 917 KH que havia participado em 1970 inscrito por David Piper. Algumas alterações são no entanto perceptíveis, tais como o novo aileron traseiro de substancial dimensão
Também o retrovisor surge apoiado num novo suporte e não directamente na capota como acontecia e o buraco aí existente passou a ser mais comprido, permitindo uma melhor visibilidade para os pilotos.
Mas 1971 foi palco do mais estranho de todos os Porsche 917. Com nome de baptismo 917/20, este carro nasceu por desafio do próprio patrocinador, o dono de um talho. Para além duma carroçaria que fugia a toda a linha ao carro que lhe dava origem, a própria decoração foi algo que acabou por celebrizá-lo através da alcunha "cochon rose" ou "pink pig".
A par do Porsche 917 LH do Team Martini Racing, talvez tenham ficado para os anais da marca pelas suas decorações, muito embora os modelos vitoriosos tenham outro sabor.
E 1971 teria sido o canto do cisne para este modelo, caso os irmãos Kremer não se lembrassem em 1981 de solicitar à marca os planos deste modelo para o adaptar à nova regulamentação então em vigor.
E daí nasceu o 917/81 cujas alterações para a original versão são imensas. Desapareceram todos os arredondamentos para a parte inferir do carro e surge pela primeira vez numa versão KH, o aileron. Três retrovisores são também novidade.
O resultado das alterações introduzidas é agradável, mas este modelo ficou longe dos brilharetes que os seus mais velhos irmãos proporcionaram à marca, culminando a edição de 1981 com uma desistência.
É caso para dizer que não existem dois Porsche 917 iguais, tais foram as quantidades de alterações introduzidas em todos eles.
Em cima uma imagem que mostra ainda o mais extraordinário de todos os Porsche 917, o 917/30 que com os seus 1300 cv dominou em Can-Am, acabando por ser banido daquele campeonato.